Diagnóstico Gestação Tratamento

HIV na gestação

Escrito por Jader Burtet

A transmissão materno-fetal do HIV em países desenvolvidos está na faixa de 1% e isso se deve ao uso de diferentes esquemas de terapia antirretrovirais (TARV) combinadas. Porém, nos últimos 10 anos, foi observado um aumento dos diagnósticos de HIV em gestantes, obtidos por meio de testagem durante o pré-natal. O que se preconiza, segundo Ministério da Saúde (2007), é que toda gestante, no primeiro e no terceiro trimestre, seja testada para HIV, bem como na admissão na maternidade em conjunto com testagem para sífilis e hepatite B. Frente a um resultado positivo, deve ser realizada a confirmação, devido aos falsos positivos que possam ocorrer, embora sejam raros. 

Após a confirmação do diagnóstico, a paciente deve realizar a carga viral e, caso seja maior que 500 cópias por mL, é indicado genotipagem para realização da TARV, mas esse exame não deve adiar o início da terapêutica. A TARV na gestação possui riscos de malformação fetal, podendo ser prescrita com esquema preferencial de tenofovir (TDF), lamivudina (3TC) e dolutegravir (DTG). A TARV é constituída por dois inibidores da transcriptase reversa, análogos de nucleosídeo/nucleotídeo e um inibidor de integrase. 

Durante o pré-natal, a gestante deve ser acolhida e o esforço direcionado para prevenção da transmissão vertical dessa patologia. Sabe-se que os principais fatores de risco para essa transmissão são relacionados à carga viral alta, tempo de bolsa rota e duração do trabalho de parto, casos de hemorragia intraparto, instrumentação no parto, aleitamento, amniocentese e outras IST concomitantes. 

Por isso, as consultas de pré-natal devem englobar exames relacionados à TARV, além de uma abordagem multidisciplinar. A frequência das consultas deve ser mensal até 32 semanas, quinzenal entre 32 e 36 semanas e, após, semanal ou mais frequente, dependendo do manejo. Um dos exames mais importantes para avaliação da transmissão vertical é a carga viral, pois, quando abaixo de 1000 cópias/mL a probabilidade é de 1%. Quanto maior a adesão ao tratamento, menor a carga viral, que deve ser supressa de 8 a 24 semanas de tratamento. Devido sua importância, é um exame solicitado mesmo após a não detecção, de 3 em 3 meses, e sua avaliação após a 34ª semana é de extrema relevância, até para decidir sobre via de parto. 

Outra questão durante a gestação são as imunizações, visto que o HIV aumenta a imunossupressão. Dessa forma, a vacinação deve ser adiada em casos que a paciente apresente linfócitos T CD4 abaixo de 200 células/mm³, infeções oportunistas ou imunodeficiência grave. Caso não haja tais condições, é indicada a vacina para pneumococo, meningocócica conjugada, Haemophilus influenzae – em gestantes com idade menor que 19 anos –, dT e dTPa, hepatite B, hepatite A e COVID-19. 

Na admissão do centro obstétrico, toda gestante deve ser testada (teste rápido), pois é um exame que possui sensibilidade de 98% em apenas 20 minutos. Além disso, é indicada a testagem da parceria da gestante, devido à alta prevalência de HIV com soroconversão durante o aleitamento materno, momento em que pode haver transmissão vertical. 

No trabalho de parto, é indicada a profilaxia com AZT, exceto gestantes que possuam carga viral indetectável entre 32 e 36 semanas. Em alguns lugares do país, como o Rio Grande do Sul, é indicada em toda parturiente. Foi demonstrado que a carga viral entre 50 e 1000 cópias possui baixo risco de transmissão, sendo uma opção individualizar o uso do AZT; já acima de 10 mil, configura um fator de risco para transmissão, sendo mandatório o uso. O AZT é administrado via intravenosa desde início do trabalho de parto e a sua suspensão deve ocorrer quando houver o clampeamento do cordão umbilical, sendo esse o esquema preferencial. Caso não haja AZT injetável, pode ser realizado AZT via oral, 300 mg no início do trabalho de parto, com manutenção a cada 3 horas até o clampeamento do cordão. Essa medicação é indicada mesmo para as pacientes com resistência a essa droga, de forma injetável.  

Caso a paciente apresente, entre 34 e 36 semanas, carga viral acima de mil cópias por mL, a via de parto será cesariana na 38ª semana, pois, dessa forma, minimiza-se os riscos de bolsa rota e prematuridade. Caso haja CV menor que mil, pode ser realizada eletivamente com 39 semanas. Se essa gestante, com indicação de cesárea, entrar em trabalho de parto, dar início ao AZT imediatamente e, em pacientes com CV maior que mil cópias com bolsa rota, realizar cesárea em 90 minutos, para infusão da droga. Caso a paciente apresente dilatação menor que 3 cm e bolsa íntegra, realizar a cesárea em 3 horas. 

Caso a gestante seja admitida no centro obstétrico em fase ativa, independentemente da sua carga viral, o parto vaginal poderá ser realizado, desde que seja rápido e eutócico. Evitar, nesse caso, toques desnecessários e tempo de latência em demasia, visto que o tempo de bolsa rota é fator de risco para transmissão vertical. Caso essa parturiente tenha carga viral indetectável, estudos sugerem que não há aumento da transmissão. 

Assim, nas gestantes com carga viral detectável, tanto a instrumentalização (fórcipe em detrimento do vacuoextrator) quanto à amniocentese deve ser indicada apenas se os riscos forem menores que os benefícios. Nas com carga viral indetectável, entretanto, não há diferença estatística quanto à amniotomia em relação às gestantes soronegativas. 

Caso haja a necessidade de realizar episiotomia (de forma criteriosa), realizar degermação e uso de compressas umedecidas com degermante. Após o nascimento, realizar de forma imediata, o clampeamento de cordão. 

Se a gestante for admitida no serviço com rupreme abaixo de 34 semanas, a avaliação do bem-estar fetal deve ser imperativa, bem como potenciais riscos de infecção. Se acima de 34 semanas com colo desfavorável, evitar induções prolongadas, principalmente nas gestantes com CV detectável. Nas com CV abaixo de mil, o risco não parece estar aumentado com o tempo de latência. 

Se entrar em trabalho de parto prematuro, realizar tocólise da mesma maneira que em uma paciente soronegativa, mas realizar AZT até inibição do processo.

Em indicações de amniocentese, realizar AZT 3 horas antes do procedimento. 

Caso a paciente evolua para hemorragia puerperal, evitar derivados de ergot, devido ao risco de vasoconstrição acentuada.

Após o parto, atentar-se ao fato de que a amamentação pode propiciar a transmissão vertical, independentemente da carga viral. Dessa forma, pode ser realizada a administração de cabergolina 1 mg, via oral, dose única, para a inibição da lactação. 

REFERÊNCIAS: 

BRASIL. Ministério da Saúde. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Profilaxia Pós-Exposição (PEP) de risco à infecção pelo HIV, IST e Hepatites Virais. Brasília, 2021. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/protocolo_clinico_diretrizes_terapeuticas_profilaxia_pos_exposicao_risco_infeccao_hiv_ist_hepatires_virais_2021.pdf. Acesso em: 01 set. 2023.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Protocolo para a prevenção de transmissão vertical de HIV e sífilis. Brasília, 2007. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/protocolo_prevencao_transmissao_verticalhivsifilis_manualbolso.pdf. Acesso em: 01 set. 2023.

RAMOS, José et al. Rotinas em Obstetrícia. 8. ed. Porto Alegre: Artmed, 2023.

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