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Sangramento uterino anormal

Escrito por Jader Burtet

Sangramento uterino anormal é considerado quando um dos quatro parâmetros menstruais estão alterados: frequência, regularidade, fluxo ou volume e duração. Possuem grande impacto na qualidade de vida e podem ser o único sinal de uma diátese hemorrágica, além de serem responsáveis por até 33% das consultas ginecológicas. Classificado como agudo o SUA que necessita de intervenção imediata e o SUA crônico, o qual ocorre a maioria dos ciclos nos últimos 6 meses. 

Devido à frequência alta de sangramento uterino anormal – de 10 a 30% de pacientes na menacme- a Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO) recomenda a classificação das causas no sistema PALM-COEIN. Divide-se assim causas estruturais (PALM) e não estruturais (COEIN). A gestação deve ser sempre descartada, pois são outras etiologias possíveis de sangramento. 

A classificação PALM-COEIN separa causas estruturais (PALM) das não estruturais (COEIN). É referente a pólipo, adenomiose, leiomioma, malignidade e hiperplasia. Já as causas não estruturais correspondem a coagulopatia, ovulação disfuncional, endométrio, iatrogênica e causas não classificadas. Os motivos estruturais, em sua maioria, são identificados em exames de imagem. 

Seguindo essa classificação, os pólipos são proliferações de estroma e glândula que podem cursar, na maioria das vezes, com sangramento intermenstrual. Possui prevalência de até 35% na população sendo a maioria assintomática. A probabilidade de benignidade é de 95%. 

A adenomiose, por sua vez, é a implantação de tecido endometrial no miométrio,  possuindo prevalência de 5 a 70% da população, sendo a maioria assintomática. Devido ao grande número de mulheres assintomáticas, é controverso sua relação com SUA. Quando causa sintoma, porém, a adenomiose cursa com dismenorreia, duração aumentada e sangramento volumoso. Ao exame pode ser encontrado útero aumentado de tamanho, denso. 

Os leiomiomas são tumores fibromusculares do endométrio presente em até 80% das mulheres. Quando sintomáticos, podem causar também quadros de dismenorreia e sangramento volumoso. Podem ainda causar sintomas compressivos. A maioria dos sintomas são causados pelos submucosos. 

O câncer de endométrio é mais comum em pacientes acima de 55 anos, mas é importante a avaliação pois o sangramento uterino anormal é o principal sintoma desta patologia. Não só o câncer de endométrio, mas câncer de colo uterino e sarcoma devem ser investigados. Constitui maior risco em pacientes com quadro de exposição prolongada a estrogênios sem oposição progestágena, síndrome de Lynch, tumores produtores de estrogênio, obesidade, nuliparidade, SOP, infertilidade, menopausa tardia, tamoxifeno, diabetes, hipertensão, tireoidopatias, doenças da vesícula. 

Nas causas não estruturais, a avaliação de coagulopatias deve ser feita, pois até 13% dos quadros de SUA, principalmente se iniciados na adolescência, podem ser devido à alteração na coagulação. Assim, avalia se durante a infância houve histórico de sangramento nasal frequente, sangramentos desproporcionais ao trauma, hematomas. Na adolescência também se questionam cistos hemorrágicos na ovulação, histórico de hemoperitônio, sangramento aumentado em extrações dentárias. Nas adultas, questionar sobre histórico de hemorragia pós-parto, sangramentos espontâneos ou pós-cirúrgicos. Na perimenopausa e pós-menopausa atentar-se para sangramentos também intestinais sem causa identificada. Cada idade a anamnese deve incluir mais questionamentos acerca dos padrões de sangramento. 

Na suspeita de discrasia sanguínea, é importante a investigação de anemia solicitando hemograma completo, ferritina, ferro sérico e saturação de transferrina. Na avaliação do coagulograma o TP (Tempo de Protrombina) e KTTPa (tempo de tromboplastina parcial ativada) normais não excluem o diagnóstico. Pode também ser solicitado fibrinogênio, análise do fator de von Willebrand, agregação plaquetária, fator XI, ensaios de fator XIII e avaliação de hiperfibrinólise sistêmica usando tromboelastometria rotacional (ROTEM) quando há forte suspeita do diagnóstico. Avaliar, conjuntamente, a dieta da paciente, pois a deficiência da ingesta de vitamina C pode causar sangramento, assim como as doenças tireoidianas. 

A avaliação laboratorial, no entanto, deve ser realizada com cautela, pois, situações de estresse, inflamação e doença podem alterar, principalmente o fator de von Willebrand. Esse fator também se altera com o uso de estrogênio, mas há estudos que mostram que os anticoncepcionais de baixa dose (30-35 mg de estradiol) podem não alterar. Já o teste de agregação plaquetária estará alterado se anemia com níveis de hemoglobina abaixo de 10 g/dL.

Nas disfunções ovulatórias pode haver desde amenorreia a irregularidade menstrual, sangramento excessivo e prolongado. Essas disfunções ocorrem pois a progesterona é determinada pela ovulação e tem sua produção mantida via corpo lúteo. Não havendo ovulação ou quando há distúrbios dela, há uma produção inadequada de progestágeno fazendo o endométrio proliferar-se sem oposição. Esse crescimento excessivo faz o endométrio frágil causando sangramento. Os extremos da vida reprodutiva são mais comuns de ocorrer o quadro, mas também podem ser causadas por alteração de eixo como hiperprolactinemia, imaturidade do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, exercício físico intenso, SOP, alterações alimentares e alterações na tireoide.

Nas alterações endometriais a serem avaliadas são ocasionadas devido alterações de vasoconstrição, inflamação ou até infecção endometrial como nos casos de endometrite, doença inflamatória pélvica. Esse diagnóstico deve ser considerado na exclusão de outras causas, pois há pouca evidência de que deficiência na produção de vasoconstritores como endotelina-1 e prostaglandina F2a ou o aumento de vasodilatadores como prostaglandina E2 e prostaciclina associados ao ativador de plasminogênio (trombólise) não são bem estabelecidas. 

Nas causas iatrogênicas o próprio anticoncepcional pode ocasionar sangramento de escape. Outros motivos são medicações como antipsicóticos, terapia de reposição hormonal, tamoxifeno, tricíclicos, dispositivos intrauterinos de cobre ou hormonais. Medicações que alterem prolactina como antidepressivos inibidores da recaptação de serotonina, antieméticos, anti-hipertensivos, opioides. Além disso o uso de anticoagulantes que geralmente é visto nas coagulopatias, mas também SUA iatrogênico. 

As outras causas incluem as malformações arteriovenosas, istmocele. 

REFERÊNCIAS: 

  1. BARROS, V. V. Como reconhecer e diagnosticar o sangramento menstrual excessivo em mulheres e adolescentes. Série Orientações e Recomendações FEBRASGO, no.4/Comissão Nacional Especializada em Tromboembolismo Venoso e Hemorragia na Mulher.  São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. FEBRASGO. cap. 2, p.6-11, 2021.
  2. SALAZAR Cristiano Caetano. Sangramento uterino anormal. Série Orientações e Recomendações FEBRASGO, no.4/Comissão Nacional Especializada em Tromboembolismo Venoso e Hemorragia na Mulher. cap.5, p.70-84, São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. FEBRASGO. 2021.. 

FREITAS, Fernando. et al. Rotinas em Ginecologia. 7.ed. Porto Alegre: Artmed Editora, 2017.

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Jader Burtet

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